Sexta-feira, 17 de maio de 2024



Dragas e balsas atuam ilegalmente no Rio Madeira

No trecho do rio Madeira que vai da região do Belmont até a usina hidrelétrica de Santo Antônio é possível ver diversas balsas e dragas, algumas ancoradas outras não. A equipe de reportagem do Diário recebeu denúncias de que estas embarcações estão atuando nessa Área de Proteção ambiental (APA) em Porto Velho. A atividade garimpeira é proibida no trecho de APA, conforme decreto 5124/91, prevê pena de seis meses a um ano e multa. Compete a Secretaria de Estado do Desenvolvimento Ambiental (Sedam) a fiscalização dessas áreas e também de todo o Estado de Rondônia.

Para realizar a extração, lavra ou pesquisa é necessária autorização ou licença da autoridade ambiental, conforme previsto pelo artigo 63 do decreto 6.514 de julho de 2008. Esta lei prevê multa de 1.500 a 3 mil reais por hectare de extração sem licenciamento. Os órgãos responsáveis pela fiscalização na região de APA confirmaram as denúncias e relataram que fiscalizações têm sido feitas. Segundo dados da Polícia Ambiental (PA), só no primeiro semestre desse ano, de janeiro a junho, já tiveram 37 ocorrências no Rio Madeira, com 63 prisões. O número de dragas e balsas apreendidas chega a 35, e foram aplicadas um total de mais R$ 736 mil em multas.

As organizações que estão atuando nestas áreas são bem estruturadas informou o Tenente Coronel Rogério Torres, Comandante do Batalhão de Polícia Ambiental (BPA) “eles têm informantes, porque algumas vezes, quando vamos fazer uma operação, chegamos ao rio e não tem nenhuma balsa ligada”, conclui o comandante. As operações realizadas pela Secretaria de Estado de Desenvolvimento Ambiental (Sedam) normalmente são conjuntas com a Polícia Ambiental, informou Sidney Serafin Rodrigues, Coordenador Adjunto da Coordenadoria de Proteção Ambiental (Copam) “a Sedam faz a parte administrativa o BPA faz a parte criminal”.

Marinha não é responsável por essas fiscalizações

Garimpo1De fevereiro a maio, a Sedam aplicou 14 notificações a dragas que estavam na área de proteção ambiental do rio Madeira mas não estavam trabalhando “nós damos ciência de que ela está em um lugar impróprio para garimpagem, se ela não cumprir a notificação vira autuação e multa”, informou Sidney.

A Marinha não é responsável pela fiscalização destas atividades no rio, mas sim, pela verificação da documentação de todas as embarcações “Fazemos inspeções não só às dragas, mas em todas as embarcações. Praticamente 85 a 90% das dragas estão documentadas junto a Marinha”, ressaltou Félix Gramajo, capitão de Corveta da delegacia Fluvial de Porto Velho.

Segundo Félix é função da marinha também o ordenamento aquaviário “balsas e dragas não podem ficar no meio do canal e oferecer perigo as outras embarcações e até mesmo não permitir o fluxo delas”, conclui Gramajo. Todos os dias a Marinha realiza inspeções no leito do rio e são aplicadas notificações que podem virar auto de infração, explicou o capitão “isso impede essas embarcações de fazer qualquer pedido dentro da Marinha do Brasil”. Essas multas podem variar de 40 a 3,6 mil reais. No período de janeiro a julho foram aplicadas em torno de 1000 multas no município de Porto Velho, afirmou Félix.

Vazão do ria madeira interfere no número de balsas e dragas 

Garimpo2De acordo com a época do ano e com a vazão do rio Madeira, diminui ou aumenta o número de balsas e dragas na região, que agem normalmente durante a noite, explicou Renê Luiz de Oliveira, superintendente Estadual do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA).

Segundo ele, o nível do rio dificulta a exploração de ouro. “Quando o rio fica muito cheio, essas balsas são pequenas, elas não conseguem explorar o leito do rio onde tem ouro em maior quantidade”, diz Luiz.

Luiz afirma que o problema do garimpo no rio Madeira é antigo “é histórico, pois boa parte de Porto Velho se estruturou em virtude do garimpo”.

Atualmente o IBAMA realiza investigações e participa de discussões sobre o tema “foi criada uma câmara ambiental com os órgãos para tomar providências sobre esse problema”, indagou Renê.

De acordo com Luiz, o que estava acontecendo é que cada instituição tinha uma linha de investigação e estava atuando sozinha “cada um estava trabalhando de forma isolada, nós resolvemos trabalhar de forma conjunta, para fazer uma operação um pouco mais contundente”, explica Oliveira. Ele destaca que ações paliativas fora das investigações ainda devem ocorrer.

A equipe de reportagem do Diário entrou em contato com o Sindicato dos Garimpeiros do Estado de Rondônia (SINGRO), mas até o fechamento desta edição não teve retorno.

Apenas 65 licenças emitidas

O procedimento para legalização é solicitado no Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM), mediante pagamento de taxas calculadas de acordo com a área requerida afirmou Deolindo de Carvalho Neto, Superintendente substituto do DNPM. Segundo Neto, na capital, existem hoje 65 licenças de lavra garimpeira. Deolindo ainda explicou como conseguir autorização para extração de minério “a pessoa ou empresa dá entrada aqui, e primeiro a gente verifica a situação da área requerida depois se pode ou não ser emitido título minerário”.

Atualmente na área de APA do rio Madeira não existe ninguém autorizado a trabalhar “temos uma recomendação conjunta da procuradoria federal e estadual para que não expedíssemos nenhum título dentro dessa área e que também façamos a anulação dos que já foram expedidos” comunicou Deolindo. Segundo o superintendente a permissão de lavra garimpeira deve ser renovada a cada cinco anos.

Polícia ambiental solicita apoio para fiscalizações

Garimpo3A polícia Ambiental enviou documentação para vários órgãos solicitando apoio à fiscalização, pois estão tendo dificuldades, por se tratar de uma área muito grande “a intenção é provocar os órgão competentes para uma junção de esforços. Nós já solicitamos a proibição de estacionamento dessas embarcações na área de APA” conclui o comandante do BPA ao esclarecer que esta medida facilitaria a fiscalização.

O Coordenador Adjunto da Copam comunicou que essas embarcações não ficarão mais na área de APA “existe uma recomendação do Ministério Público que nenhuma draga pode ficar nesse perímetro mais, é proibido e é baseado nisso que estamos atuando”, afirmou Sidney. Uma das soluções apontadas seria a criação por parte do município de um plano de ordenamento costeiro que determine se as balsas podem ficar ancoradas nesta região, explicou o Capitão de Corveta. “O governo federal criou um plano nacional de gerenciamento costeiro, ele determina ao estado e município criarem seus próprios planos decorrentes do nacional”, disse Félix.

A ação pedagógica de multa e apreensão desestimula esse tipo de crime, mas a forma mais viável de agir é descobrir quem está financiando essas atividades ilegais “a partir daí entram as linhas de investigação, identificando para onde está indo esse ouro e quem é o verdadeiro dono, porque não é o balseiro, tem um chefão ali atrás”, ressaltou Renê.

A partir das investigações haveria maior eficácia no combate “depois de uma operação quando você vira as costas eles voltam a operar. A gente precisa buscar uma alternativa que reprima isso de uma forma mais efetiva e eficiente”, explicou o Superintendente do IBAMA afirmando que vai acontecer uma operação conjunta.

O DNPM informa que o correto é manter vigilância na área de APA mas conta com quadro reduzido de funcionários para isso “hoje nós temos um profissional para fiscalizar os Estados de Rondônia e Acre. Não temos como manter essa vigilância”, comunicou Deolindo.

A Sedam declarou que tem dificuldades em realizar a fiscalização porque deveria ter mais servidores para atuar “é humanamente impossível você ficar 24 horas monitorando, não tem como fazer diariamente, precisamos de mais servidores que desempenham a função de fiscalização”, conclui Sidney.

Excesso de mercúrio na extração do ouro

Garimpo4O mercúrio (Hg) utilizado pela ação de garimpo e extração do ouro causa poluição ambiental “o manejo irregular do mercúrio é altamente poluente causando uma doença neurológica que ataca o sistema nervoso, pela ingestão de Hg”, alertou Félix.

“Na realidade não é o excesso do mercúrio só de agora que eles utilizam na captura de ouro, ele se mantém na cadeia eternamente”, disse Renê. O Superintendente avisa que se existe mercúrio no rio e algum peixe ingere esse mercúrio todos podem estar com este Hg presente no organismo, pela própria ingestão deste peixe.

O professor da Universidade Federal de Rondônia (Unir) Wanderley Rodrigues Bastos, está a frente de uma pesquisa para calcular as concentrações de mercúrio nos diferentes ambientes, como água, sedimentos, solos, plantas aquáticas e peixes. Esse estudo ocorre desde 1987 e começou pela importância de monitoramento na bacia do Rio Madeira “em função dos grandes lançamentos de Hg pelas atividades de garimpo de ouro entre os anos 70 e 90, fase da Corrida do Ouro”, explicou o professor.

Duas formas de lançar o mercúrio nas águas

Atualmente existem outras formas de lançamento deste mercúrio nas águas do rio “o uso e ocupação desordenado da região desprotegendo os solos são grandes contribuidores de Hg pra os cursos d´água, pois os solos antigos Amazônicos contém originalmente Hg”, ressaltou Wanderley.

“A pesquisa apontou que os níveis de mercúrio nos ambientes como água, sedimentos e solos estão abaixo da média recomenda da pela Legislação Brasileira Vigente”, conclui o Bastos. Ele informou que as espécies de peixes, nas quais encontramos maior concentração de mercúrio são àquelas que estão no topo da cadeia “alguns indivíduos das espécies de topo da cadeia alimentar ultrapassam o que preconiza a ANVISA, entretanto a maioria das espécies estão dentro do preconizado pela Legislação”.

Bastos explica que o Hg é uma substância neurotóxica que tem ação sobre o Sistema Nervoso Central, podendo causar comprometimento motor, da visão, da audição e até mexer com a sensibilidade das mãos, Wanderley alerta que esta substância também pode passar de mãe para filho durante a gestação.

O professor enfatiza que não há necessidade de se preocupar com níveis de mercúrio encontrados “eles precisam ser acompanhados e monitorados, principalmente em função das transformações que a região vem passando, principalmente nas populações ribeirinhas que consomem maior quantidade de peixes”.

Fonte: Diário da Amazônia


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