Quarta-feira, 24 de abril de 2024



TJ/RO mantém a condenação de ex-secretário municipal de Saúde de São Miguel do Guaporé à perda dos direitos políticos por três anos

Eurico Montenegro Júnior, desembargador do TJ/RO e relator dos autos de número 7001133-44.2016.8.22.0022, origem comarca de São Miguel do Guaporé, negou recurso de apelação interposto por Valdeci Elias, ex-secretário de Saúde, na ação de improbidade administrativa, proposta pelo MPE/RO. No dispositivo final do acórdão, o eminente relator disse o seguinte: “Além da compreensão de que basta o dolo genérico – vontade livre e consciente de praticar o ato – para configuração do ato de improbidade administrativa previsto no art. 11 da Lei n. 8.429/1992, exige a presença da má-fé, pois a Lei de Improbidade Administrativa não visa punir meras irregularidades ou o inábil, mas sim o desonesto, o corrupto, aquele desprovido de lealdade e boa-fé. Precedente do STJ. 2. O conjunto probatório convergente à prática de ato ímprobo deve ser considerado para o seu reconhecimento e eventual condenação. 3. Negado provimento ao recurso de apelação. Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Magistrados da 1ª Câmara Especial do Tribunal de Justiça do Estado de Rondônia, na conformidade da ata de julgamentos e das notas taquigráficas, em, recurso não provido, à unanimidade”.

PROCESSO NA ORIGEM

Na origem, a decisão ficou assim registrada: “Ante o exposto, nos termos do artigo 487, I do CPC; nos termos do 37, caput, incisos II, IX e §4º, da Constituição Federal, na Lei nº 7.347/85 e artigos 4º, 11 e 12, inciso III e parágrafo único, da Lei 8.429/92 julgo procedente os pedidos iniciais para: a) condenar o requerido Valdeci Elias no pagamento de multa civil no valor de cinco vezes a última remuneração percebida como Secretário Municipal de Saúde; b) determinar a proibição de Valdeci Elias de contratar com o poder público Municipal de São Miguel do Guaporé ou receberem benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual sejam sócios majoritários, pelo prazo de 03 (três) anos. Para tanto, oficie-se à Fazenda Pública Municipal; c) determinar a suspensão dos direitos políticos de Valdeci Elias, pelo prazo de 03 (três) anos. Para tanto, oficie-se à Justiça Eleitoral de São Miguel do Guaporé, para as providências necessárias, nos termos do artigo 71 e seguintes, do Código Eleitoral. Condeno o requerido ao pagamento das custas processuais. Os valores da multa deverão ser depositados na conta do juízo destinada ao recolhimento de valores oriundos de condenações. Sem incidência de honorários advocatícios. Com o trânsito em julgado abra-se vista ao Ministério Público requerer o que de direito. Na hipótese do Ministério Público requerer o cumprimento forçado desta sentença, desde já fica autorizada a mudança da classe do feito. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Cumpra-se”.

ALEGAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO

Para conseguir a condenação de Valdeci Elias, o Ministério Público Estadual, alegou o seguinte: “Sustenta o autor, que expediu inúmeros ofícios à Secretaria Estadual de Administração de Rondônia – SEAD/RO visando obter informações e documentos para a instrução de diversos procedimentos investigatórios, contudo, desde quando o requerido assumiu o respectivo cargo, diversos ofícios ministeriais não foram respondidos ou o foram intempestiva e/ou insuficientemente, mesmo após reiterações. Juntou aos autos cópia de ofícios enviados ao requerido, cujas respostas foram por ele omitidas ou não prestadas no prazo assinalado ou vieram incompletas, o que impediu a atuação satisfatória do parquet e, consequentemente os interesses da sociedade. Aduz que por conta da desídia do requerido, expediu a Recomendação nº 004/2016/PJSMG, para fins de providências necessárias com o fim de garantir que os ofícios enviados pelo Ministério Público à Semsau fossem respondidos no prazo assinalado ou, em caso de impossibilidade, que fosse solicitado, tempestivamente dilação de prazo. Juntou documentos. O requerido foi devidamente notificado e apresentou defesa prévia. O Município manifestou interesse em integrar a lide. A inicial foi recebida e determinada a citação do requerido, que apresentou contestação. O feito foi saneado e foi fixado os pontos controvertidos. Em audiência de instrução foram ouvidas duas testemunhas e o requerido foi interrogado. O Ministério Público apresentou alegações finais, requerendo a procedência dos pedidos iniciais. O requerido Valdeci, por sua vez, em alegações finais, requereu a improcedência dos pedidos”.

DA SENTENÇA

Em sua decisão, o juízo de origem, frisara o que seque: “A ação deve ser julgada procedente. A Lei n.º 8.429/92 classifica os atos de improbidade administrativa nos artigos 9º, 10, 10-A e 11, dispondo, respectivamente, tratarem-se de atos que importam em enriquecimento ilícito; atos que causam prejuízo ao erário; atos decorrentes de concessão ou aplicação indevida de benefício financeiro ou tributário e atos que atentam contra os princípios da Administração Pública. Segundo argumenta o Ministério Público na peça inicial, o requerido estaria incurso na última hipótese acima mencionada. Feitas estas relevantes considerações, passo então a analisar se a conduta praticada pelo demandado enquadra-se na hipótese tipificada no artigo 11, caput da Lei 8.429/92 e se foi ou não praticada com dolo. Para a caracterização da referida hipótese, necessário se faz que o demandado, mediante ação dolosa, tenham atentado contra os princípios da Administração Pública, violando os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade e lealdade à instituição à que servem (Lei 8.429/92, artigo 11, caput). O Ministério Público acusou o requerido Valdeci de ter atentado contra os princípios da administração, pelo fato de que não respondia os ofícios encaminhados pelo parquet e, quando fazia era intempestivamente ou de forma incompleta. O requerido, ouvido em juízo, disse que trabalhou na Secretaria de Saúde por 1 ano. Disse que quando tomou posse no cargo, o antigo Secretário não havia repassado a relação de ofícios pendentes. Disse, também, que teve conhecimento da Recomendação expedida pelo Ministério Público, cujo teor era acerca de providências para as respostas de ofícios que o fossem encaminhados. Relatou que Cristiane era a responsável pelo recebimento de ofícios e requisições, sendo que, quando havia prazos perto de vencimento ela o avisava. Narrou que não teve conhecimento do ofício no qual solicitou informações acerca do processo administrativo que visava apurar falha médica, apenas quando da notificação desta ação civil pública que tomou conhecimento. Disse, que a pessoa de Cristiane era a responsável para responder os ofícios e requisições. Relatou que em alguns casos, solicitou a dilação de prazo ao Parquet. No mais, disse que Cristiane também não tinha conhecimento do ofício que requereu informações acerca do processo de sindicância acima mencionado. Em análise aos autos, verifica-se que o Ministério Público, por reiteradas vezes, oficiou à Secretaria Municipal de Saúde, para fins de informações do processo administrativo de nº 1693/2014, no qual tinha a finalidade apurar a responsabilidade de falha médica, ocorrido no nosocômio municipal. A primeira determinação de informações acerca desta apuração de falha médica pelo Parquet, ocorreu em 2014, quando ainda o Secretário Municipal de Saúde era Elivelto Kovalhczuk. O requerido, foi oficiado pela primeira vez em 14/12/2015 – Ofício 648/2015 PJ-SMG -, para fins de informações acerca da sindicância, sendo que o Ofício foi recebido por Nilta Pêgo da Silva. Em 29/02/2016 foi reiterado o ofício – Ofício nº 086/2016 PJ-SMG – ao Secretário, ora requerido, o qual foi recebido em 08/03/2015 por Cristiane. Em 29/03/2016 foi certificado no processo extrajudicial do Parquet a ausência de resposta acerca dos Ofícios de nº 485, 648/2015 e 086/2016, razão pela qual foi expedida Recomendação nº 004/2016 PJ – SMG ao Secretário Municipal de Saúde para que adotasse as providências necessárias para as respostas dos ofícios de nº 648/2015 e 086/2016 -PJ – SMG. O requerido tomou conhecimento da aludida Recomendação em 31/03/2016. Em 16/05/2016 o requerido foi novamente oficiado – Ofício nº 314/2016 PJ- SMG informando acerca de resposta acerca da Recomendação expedida. Consta também nos autos, Ofício de nº 282/2016 PJ – SMG expedido para o requerido, para fins de informações acerca das providências tomadas pela SEMUSA, visando sanar irregularidades encontradas na Unidade Mista de Saúde, o qual foi recebido pelo requerido em 02/05/2016. Nota-se, portanto, a desídia por parte do requerido, eis que constam nos autos, inúmeras reiterações de Ofícios expedidas ao Secretário Municipal de Saúde para que informasse acerca do procedimento administrativo nº 1693/2014, contudo, não foram respondidos. A reiteração de Ofícios acerca do caso é desde o ano de 2014, sendo que o requerido só veio tomar conhecimento em 14/12/2015. Mas a reiteração de pedidos acerca do aludido processo administrativo ainda perdurou até o ano de 2016. Vale ressaltar que nem mesmo a expedição de Recomendação nº 004/2016 foi suficiente para que o requerido cumprisse com seu ofício. A conduta do requerido não só atentou contra os princípios da administração pública, notadamente da eficiência, como também, interferiu na atuação do Parquet para a apuração de falha médica ocorrida no ano de 2014. E mais, atingiu também, o interesse da sociedade em ver a apuração do ato ilícito ocorrido em tempo razoável. Diante destas considerações não é de se aceitar a alegação do requerido de que não teve conhecimento dos fatos, atinentes à apuração de falha médica ocorrido no nosocômio, pois, várias vezes foram reiterados ofícios, sobretudo, foi notificado, pessoalmente, acerca da Recomendação no qual solicitava providências, justamente do procedimento administrativo relacionado a apuração da falha médica. O requerido, na condição de Secretário Municipal de Saúde, tinha o dever de tomar conhecimento do teor de ofícios, requisições e recomendações que lhe foram encaminhadas – ao menos é o que se espera -, ainda que fossem recebidos por terceira pessoa. Somada a isso a testemunha Nilta Pêgo da Silva disse que trabalha no setor administrativo da Secretaria de Saúde tendo dito que é uma das recebedoras de ofícios e requisições. Relatou, também, que Cristiane é a servidora responsável para recebimento dos ofícios, sendo que era ela quem informava o Secretário do vencimento de prazos. No mais, torna-se visível o dolo do requerido, por ser ele absolutamente consciente de que tinha o dever de responder aos ofícios e requisições expedidos pelo Parquet, ainda mais pelo fato de ter tomado conhecimento de Recomendação, por ele próprio recebido, para este fim. Dolo que, na hipótese, aparece de forma límpida, diante da postura renitente do requerido em, reiteradamente, omitir-se às inúmeras requisições de informação, mesmo quando do conhecimento expresso sobre a Recomendação n. 004/2016. Assim, restou comprovado nos autos a violação dos princípios constitucionais praticado pelo requerido. De acordo com o princípio da proporcionalidade a reprimenda deve se adequada a lesividade da infração cometida. Com esses fundamentos, passo a individualizar as penas. Restou evidenciado nos autos que o requerido Valdecir atentou contra os princípios da administração, notadamente os da legalidade, eficiência, moralidade e publicidade. Assim, incorreu no previsto no artigo 11, II da Lei n. 8.429/92. O requerido Valdecir, na qualidade de Secretário Municipal de Saúde, tinha plena consciência de sua obrigação em responder o que fosse solicitado por autoridades, contudo, não o fez de forma reiterada, ofendendo aos princípios da Administração Pública. Dito isso, levando em conta a gravidade dos fatos; critérios de razoabilidade e proporcionalidade, bem como, levando em consideração os parâmetros para a aplicação da multa civil – patrimônio do agente; ganho financeiro mensal; dano gerado e grau de culpa – e, considerando ainda ausência do primeiro e segundo parâmetros, condeno o requerido Valdecir ao pagamento de multa civil no valor de cinco vezes a última remuneração percebida como Secretário Municipal de Saúde. Considerando a conduta grave do requerido, bem como com o fim de se evitar estímulo à eventual recidiva, determino a suspensão dos direitos políticos do requerido Valdecir pelo prazo de 03 (três) anos, bem como proibição de contratar com o Poder Público Municipal de São Miguel do Guaporé ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócia majoritária, pelo prazo de 03 (três) anos”, concluiu. (Jornalista Ronan Almeida de Araújo – DRT-RO-431-98).

 

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