Quarta-feira, 01 de maio de 2024



Imóvel desapropriado por Confúcio Moura, ex-governador de Rondônia, comprado por R$ 9 milhões, não serve para nada, diz TCE/RO

Valdivino Crispim de Souza, conselheiro do tribunal de contas do estado de Rondônia e relator dos autos do processo de número 02179/19 – TCE/RO, sobre procedimento apuratório preliminar de fiscalização de atos e contratos, de responsabilidade da Secretaria de Estado de Assistência Social (SEAS), que trata sobre desapropriação de imóvel, autuado no processo administrativo de número 01- 2301.00266-0000-2014, mandou instaurar o referido procedimento contra a seguinte “galera”: Confúcio Aires Moura, ex-governador do Estado de Rondônia; Márcio Antônio Félix Ribeiro, ex-Secretário de Estado de Assistência Social (SEAS); Natália de Souza Barros, ex-coordenadora de Administração e Finanças (SEAS); Juraci Jorge da Silva, Procurador Geral do Estado de Rondônia, à época; Leonor Schrammel, ex-controlador Geral do Estado de Rondônia; Luiz Carlos de Oliveira e a esposa Soraya Verzeletti Oliveira, proprietários do imóvel objeto da desapropriação; Álvaro Lustosa Pires Júnior, presidente da Comissão Temporária Especial de avaliação do imóvel; Luismar Almeida de Castro, membro da Comissão Temporária Especial de avaliação do imóvel; Pedro Martins Neto, membro da Comissão Temporária Especial de avaliação do imóvel; Leonardo Gonçalves da Costa, membro da Comissão Temporária Especial de avaliação do imóvel; Ênio Torres Soares, membro da Comissão Temporária Especial de avaliação do imóvel; Jorge Luiz de Almeida, membro da Comissão Temporária Especial de avaliação do imóvel; Antônio Monteiro de Lima, membro da Comissão Temporária Especial de avaliação do imóvel.

Agora veja o desabafo do conselheiro: “Veja-se que houve o gasto de uma cifra milionária, considerando apenas o valor desta desapropriação (além das outras duas que são objeto dos processos 2137/16 e 2737/19 e que, ao todo, somaram R$ 9.000.000,00). 99. É fato público e notório que, àquela época, o Estado de Rondônia vivenciou uma das mais graves crises sociais já vistas: localidades ficaram sem acesso à água potável para consumo humano; milhares de pessoas perderam suas casas, seus pertences, sua cultura, seu meio de subsistência; as doenças se proliferaram; as atividades de pesca ficaram prejudicadas. 100. Basta uma simples consulta &agra ve; rede mundial de computadores para lembrar dos tristes fatos que assolaram Rondônia àquela época. 101. A despeito disso, o Estado promoveu a desapropriação de uma área que estava inundada, sem nenhum planejamento, sem nenhum projeto para a ocupação. Houve a compra de um imóvel que não tinha possibilidade de ser usado para absolutamente nenhuma finalidade pública. Foram gastos três milhões de reais em troca de nenhum resultado para a população, a despeito de todas as necessidades públicas prementes àquela época. 103. Dessa forma, também no aspecto social, é impossível deixar de registrar a completa ilegitimidade e imoralidade do ato administrativo em questão, dado o gasto de milhões de reais para nenhuma finalidade, ao passo que os atingidos pelas ceias tinham demandas urgentes a serem atendidas. 104. Diante de todos esses f atos, verifica-se que a desapropriação concretizada pelo Estado violou frontalmente os princípios da eficiência e moralidade, expressamente previstos na Constituição Federal (art. 37). 3.3. Das consequências jurídicas da declaração de ilegalidade do ato. 105. Considerando a ilegalidade e ilegitimidade do ato administrativo objeto destes autos, é inevitável reconhecer a nulidade do mesmo. 106. É relevante mencionar que, no caso em análise, a declaração de nulidade é medida que se impõe, uma vez que o ato não gerou nenhuma finalidade pública, tampouco ensejou nenhum investimento estatal. 107. Assim, o ato é nulo desde sua origem e nenhum prejuízo haverá na declaração dessa nulidade, já que nada mudou na situação de fato do imóvel. 108. Com a anulação, além da responsabiliza dos agentes que colaboraram para a prática deste ato, é imprescindível o ressarcimento do dano oriundo da desapropriação. 109. Esse dano é inquestionável pois, como já dito, o Estado, a despeito de ter dispendido R$ 3.000.000,00 para a compra do imóvel, nunca o utilizou para as finalidades descritas no ato administrativo (nem poderia fazê-lo), dada a completa inadequação e imprestabilidade da área para os fins a que se destinavam. 110. Por este motivo, verificada a prática de irregularidade que resultou em dano ao erário, é imprescindível a conversão deste processo em tomada de conta especial, tudo nos termos do art. 44, da Lei Orgânica deste Tribunal (LCE 154/96): […]. 111. Antes, porém, de tratar da responsabilidade pelo dano e pela irregularidade apontada nestes autos, é necessário, de antemão, fazer uma consideração acerca da inocorrência da prescrição no caso em análise, apesar da data dos fatos. […]. (Sem grifos no original). Identificadas as irregularidades, a teor dos fundamentos transcritos, a Unidade Técnica estabeleceu o nexo causal entre a conduta dos responsáveis e o potencial resultado ilícito, nas seguintes matrizes”, disse.

O relator concluiu taxativamente nos seguintes termos: “Diante dos argumentos expostos, pelo que consta dos autos nesta análise ainda não conclusiva, conclui-se pela ilegalidade e ilegitimidade do ato de desapropriação materializado no processo administrativo n. 01.2301.00.266-0000/2014, por vícios nos elementos finalidade e motivo do ato administrativo, bem como pela total ausência de planejamento do ato, o que causou dano ao erário no importe de R$ 3.000.000,00 (três milhões de reais), o qual deve ser imputado aos seguintes agentes: 4.1. Álvaro Lustosa Pires Júnior, Luismar Almeida de Castro, Pedro Martins Neto, Leonard o Gonçalves da Costa, Ênio Torres Soares, Jorge Luiz de Almeida, e Antônio Monteiro de Lima, por terem promovido a avaliação do imóvel, nos termos delineados no quadro 1, constante no item 3.5.1 deste relatório, 1 violando, em tese, os princípios da eficiência e da moralidade (art. 37, CF); 4.2. Márcio Antônio Félix Ribeiro e Natália de Souza Barros, por terem determinado o pagamento do valor relativo à desapropriação, superando os alertas feitos pelo órgão de controle interno, tudo nos termos constantes no quadro 2, do item 3.5.2 deste relatório, violando, em tese, os princípios da eficiência e da moralidade (art. 37, CF); 4.3. Luiz Carlos de Oliveira, CPF 156.767.901-30 e, em litisconsórcio necessário, a cônjuge Soraya Verzeletti Oliveira, CPF 457.582.802-59, […] por ter silenciado quanto a fato essencial à desapropriação e, com isso, ter-se enriquecido sem justa causa às custas do erário, fato que viola, em tese, os artigos 147 e 884, do Código Civil, conforme constante no quadro 3, do item 3.5.3 deste relatório. […]. (Sem grifos no original). Diante das irregularidades em voga, o Corpo Técnico de auditoria, em juízo prévio de seletividade, propôs o processamento deste PAP como Fiscalização de Atos e Contratos, com a pronta conversão em processo de Tomada de Contas Especial (TCE), de modo a que os responsáveis sejam citados para o exercício das garantias constitucionais do contraditório e da ampla defesa. No mais, de imediato, a Unidade Instrutiva sugeriu o encaminhamento de cópia do relatório técnico ao Ministério Público do Estado de Rondônia (MP/RO), no sentido de que este apure, no âmbito de sua competência, eventuais atos de improbidade administrativa. Extrato. Proposta de encaminhamento. Ante todo o exposto, propõe-se ao relator: 5.1. O processamento do presente procedimento apuratório preliminar como “fiscalização de atos e contratos” e sua conversão em tomada de contas especial, nos termos do art. 44, da Lei Orgânica do TCE/RO (LCE 154/96); 5.2. A abertura de contraditório aos agentes apontados no item 4 (conclusão) a fim de que possam defender-se dos fatos a eles imputados; 5.3. O encaminhamento de cópia do presente relatório ao Ministério Público do Estado de Rondônia, para que tome conhecimento dos fatos, especialmente por considerar a possível subsunção do caso à hipótese do art. 10, da Lei n. 8.429/92. Nesses termos, os autos vieram conclusos para decisão. Preliminarmente, verifica-se a existência dos elementos de convicção para o início da ação de controle neste Tribunal de Contas, segundo os fundamentos abaixo delineados, na forma do art. 6º, III, da Resolução nº 291/2019/TCE-RO3. Ademais, frente aos possíveis vícios identificados no ato de desapropriação, afere-se que o procedimento em voga contém natureza de Fiscalização de Atos e Contratos, a teor do art. 38 da Lei Complementar nº 154/964 , portanto, é processo específico para tratar 3 Art. 6º São condições prévias para análise de seletividade: I – competência do Tribunal de Contas para apreciar a matéria; II – referência a um objeto determinado e a uma situação-problema específica; e III – existência de elementos de convicção razoáveis para o início da ação de controle. […]Art. 10 […] §1º A proposta de fiscalização indicará: I – o processamento do PAP em ação de controle específica, na forma do Regimento Interno; […]. Para assegurar a eficácia do controle e para instruir o julgamento das contas, o Tribunal efetuará a fiscalização dos atos de que resultem receita ou despesa, praticados pelos responsáveis sujeitos à sua jurisdição, competindo-lhe, para tanto, em especial: […] II – realizar, por iniciativa própria, na forma estabelecida no Regimento Interno, inspeções e auditorias da matéria, a teor do artigo 10, §1º, I, da Resolução nº 291/2019/TCE-RO. Em análise ao ato de desapropriação, o Corpo Técnico levantou os seguintes achados d e audito ria, extrato: […] 3.2.1. Vício no elemento finalidade: ausência de interesse social. 44. O elemento finalidade é aquele que determina que o ato administrativo deve ser direcionado ao atendimento do interesse público, isto é, deve haver um objetivo que privilegie o atendimento de uma necessidade ou interesse da população diretamente atingida. 45. Pois bem. 46. No caso ora analisado, a finalidade do ato era o atendimento das famílias atingidas pela cheia de 2014, com o objetivo de retirá-las das áreas alagadas e assentá-las em áreas secas. 47. No entanto, como visto no relatório constante, que retratou as conclusões da visita técnica feita no imóvel, a área desapropriada estava alagada naquele período, além de já ser ocupada por famílias tradicionais ribeirinhas e não possuir nenhuma infraestrutura que permitisse novas famílias, como água tratada, definição ou delimitação de lotes para o assentamento, acesso adequado. 48. Ora, como seria possível usar uma área que estava inundada, que já era ocupada e que não tinha nenhuma estrutura para alocar novas famílias vítimas de inundação? Como seria possível o atingimento da finalidade pública do ato diante desse cenário? 49. A contradição do ato com a situação existente à época é nítida e perceptível até mesmo numa análise simplória, já que não é minimamente lógico e razoável acreditar que uma área alagada poderia ser usada para reassentamento de famílias vítimas de inundação. 50. Assim é certo que o ato não atingiu, e nem teria a possibilidade de atingir, nenhuma finalidade pública ou social, já que, à época em que foi desapropriada, a área estava alagada e não tinha (e ainda não tem) nenhum item mínimo de infraestrutura para alocação de novas famílias. 51. Ademais, conforme informado pelos moradores da região, usualmente, a área sofre com as enchentes do Rio Madeira, o que ocorreu, inclusive, neste ano de 2019. Não bastasse esse fato, ainda há de se considerar que o imóvel, ao ser adquirido pelo Estado, não estava livre e desembaraçado, pois já era ocupado por população ribeirinha há aproximadamente 60 (sessenta) anos, o que foi constatado na visita técnica retratada. É das máximas de experiência que nem mesmo o mais leigo dos homens adquire imóvel ocupado há tantos anos, pois são consabidas as dificuldades inerente s ao uso de área nessas condições, até mesmo em razão dos direitos relativos à prescrição aquisitiva (usucapião). 54. Dessa forma, é nítido o vício na finalidade do ato, por total mesma natureza que as previstas no inciso I do art. 36, desta Lei Complementar”, finalizou. (Jornalista Ronan Almeida de Araújo – DRT-RO 431-98).


spot_img


Pular para a barra de ferramentas