Domingo, 28 de abril de 2024



CNJ suspende decisão do TJ/RO que nomeou a juíza Euma Mendonça Tourinho para compor a Turma Recursal

Tânia Regina Silva Reckziegel, relatora dos autos 0004997-55.2020.2.00.0000 e conselheira do CNJ, deferiu medida liminar pleiteada pelo juiz José Torres Ferreira, no sentido de suspender a nomeação da magistrada Euma Mendonça Tourinho para compor a 2ª Vaga como membro titular da Turma Recursal do TJ/RO. O procedimento de controle administrado foi distribuído no CNJ no dia 28/06/2020, em que figura como parte contrária a Corregedoria Geral de Justiça do TJ/RO. A juíza Euma Mendonça Tourinho é titular da Vara de Proteção à Infância e Juventude da Comarca de Porto Velho e o magistrado José Torres Ferreira é titular da 2ª Vara Cível dos Juizados Especiais da Comarca de Porto Velho.

A “briga” dos dois magistrados está ligada a uma vaga na Turma Recursal do TJ/RO, instância superior que decide ações relacionadas a pequenas causas, sejam civis ou criminais. O procedimento de escolha do nome do magistrado para integrar a Turma Recursal se refere a dois processos administrativos, a saber: 0004997-55.2020.2.00.0000 e 0013865-36.2018.8.22.8000. O diário da justiça eletrônico do TJ/RO publicou hoje a decisão em suspender a nomeação da juíza Euma Mendonça Tourinho à referida turma e foi assinada pelo desembargador Paulo Kiyochi Mori, presidente da corte.

“MATA-LEAO”

O juiz José Torres Ferreira, juiz titular do 2° Juizado Cível da Comarca de Porto Velho, está respondendo a um processo administrativo disciplinar na Corregedoria Geral de Justiça do TJ/RO e no Conselho Nacional de Justiça, em razão de ter dado chutes e aplicar gravata “mata-leão” em uma vítima. A confusão envolvendo o juiz aconteceu em outubro de 2019, em Porto Velho, capital do Estado de Rondônia. Toda agressão foi gravada por câmeras de monitoramento. José Torres Ferreira é considerado um dos juízes mais ágeis do Brasil, por promover despacho e decisões bastante rápidas, tanto no 2° Juizado Cível da Comarca de Porto Velho quanto na Turma Recursal, sendo que no juízo especial colegiada atuou até recentemente.

No pedido de providência contra o magistrado, a peça inaugural informa que o juiz, acompanhado de uma guarnição da Polícia Militar, em diligência de seu interesse pessoal, sob o pretexto de tomar satisfações de suposta agressão a familiar, fora do exercício de suas atribuições funcionais, dirigiu-se até determinado estabelecimento esportivo informado nos autos e que chegando ao local, sem que a suposta vítima tivesse esboçado qualquer ação, passou a golpeá-la com socos, derrubando-a ao chão, continuando as agressões com chutes. Consta, ainda, que o investigado foi parcialmente contido pelos policiais que estavam no local dos fatos, mas progrediu em suas investidas, voltando a atingir a suposta vítima com chutes e aplicando-lhe também uma gravata ou “mata-leão”. Em assim agindo, o investigado contrariou, em tese, o disposto nos art. 35, VIII, da LOMAN e artigos 1º, 2º e 16 do Código de Ética da Magistratura, por infringência de dever de conduta irrepreensível na vida pública e particular, compatível com a dignidade, a honra e o decoro de suas funções. Consta também que, nesse mesmo contexto fático, o investigado, com uma arma em punho, teria proferido palavras em forma de ameaça, dizendo que não mataria a suposta vítima, mas se quisesse o teria feito.

‘CARTEIRADA’

Não há dúvida de que o magistrado José Torres Ferreira será punido pelo Tribunal de Justiça do Estado de Rondônia. Agora não se sabe que tipo de punição receberá do Pleno Administrativo, composto por 21 desembargadores, do TJ/RO, que vão “bater o martelo” em desfavor do juiz. A Lei Orgânica da Magistratura Nacional, criada pela Lei Complementar de número 36, de 14/03/1979, registra que, no capítulo II, sobre as penalidades que são usadas para punir um juiz ou uma juíza que pratiquem algum tipo de abuso de autoridade em exercício profissional. O artigo. 42, do mesmo códex, menciona os tipos de punição, a saber advertência; censura; remoção compulsória; disponibilidade com vencimentos proporcionais ao tempo de serviço; aposentadoria compulsória com vencimentos proporcionais ao tempo de serviço e demissão.

Já o título III, que versa sobre disciplina judiciária, e o capítulo I, que menciona sobre os deveres dos magistrados, previstos no artigo 35, da LOMAN, preveem o seguinte: “Cumprir e fazer cumprir, com independência, serenidade e exatidão, as disposições legais e os atos de ofício; – não exceder injustificadamente os prazos para sentenciar ou despachar; determinar as providências necessárias para que os atos processuais se realizem nos prazos legais; tratar com urbanidade as partes, os membros do Ministério Público, os advogados, as testemunhas, os funcionários e auxiliares da Justiça, e atender aos que o procurarem, a qualquer momento, quanto se trate de providência que reclame e possibilite solução de urgência; residir na sede da Comarca salvo autorização do órgão disciplinar a que estiver subordinado; comparecer pontualmente à hora de iniciar-se o expediente ou a sessão, e não se ausentar injustificadamente antes de seu término; exercer assídua fiscalização sobre os subordinados, especialmente no que se refere à cobrança de custas e emolumentos, embora não haja reclamação das partes; manter conduta irrepreensível na vida pública e particular”.

Os processos administrativos contra o magistrado José Torres Ferreira só existem porque ele cometera abuso de autoridade, ou seja, falando numa linguagem comum, seria o mesmo que dizer “carteirada”. Se o juiz não procurasse a Polícia Militar do qual se apresentara como magistrado do TJ/RO, para acompanhá-lo quando deu chutes e aplicou golpe conhecido “mata-leão” e ameaçou de morte a suposta vítima, obviamente, que não responderia a nenhum processo disciplinar tramitando na Corregedoria Geral de Justiça do TJ/RO e Conselho Nacional de Justiça, que vão aplicar uma punição exemplar o magistrado. Essa é a minha ótica. O caso teve grande repercussão nacional e manchou a imagem não só do juiz, mas também da corte rondoniense, que não poderá tolerar que um de seus membros se envolva em confusão de tamanha proporção.

O QUE ACONTECEU

Em pesquisa sobre o que levou o magistrado José Torres Ferreira a se envolver numa baita confusão, ao que parece, o caso está ligado a um acidente de trânsito, ocorrido no Estado do Mato Grosso. O condutor do veículo que causou o acidente é a pessoa que aparece no vídeo apanhando igual Judas, que se recusara de pagar uma indenização ao magistrado, mesmo que tenha sido vitorioso na demanda, que por sinal, foi decidida pela magistrada sua “amiga” Euma Mendonça Tourinho, que julgou procedente o pedido indenizatório, porém com valores muito baixos, pela proporção que representou o evento danoso (acidente). O magistrado recorreu em instância superior, que majorou a condenação para valores muito além do que foram fixados em instância de juízo singular. O juiz perdeu a cabeça, ganhou a ação e pode lhe representar a perda da função do servidor público e do cargo como magistrado do Estado de Rondônia, que é o empregador do magistrado.

OS PROCESSOS

Além dos dois processos administrativos que o magistrado José Torres Ferreira está respondendo, um no CGJ-TJ/RO, e o outro no CNJ, certamente a vítima que apanhou do juiz deve ter representado criminalmente o juiz-infrator na Delegacia de Polícia mais próxima onde os fatos aconteceram. Ao que se sabe, a vítima recebeu golpes, chutes e a gravata “mata-leão”, e esta última palavra, por si só, já diz o seu significado. Se a gravata quase tirou a vida do golpeado, então o magistrado deve estar respondendo ao crime de tentativa de homicídio, previsto no artigo 14, II, do Código Penal brasileiro, que afirma o seguinte: “Diz o crime: tentado, quando, iniciada a execução, não se consuma por circunstâncias alheias à vontade do agente”. Exemplo de tentativa de homicídio: infrator afirma a que a vítima chegou, empurrou-o e lhe deu um golpe conhecido por “mata-leão”, é socorrida e recebe atendimento médico. O laudo atesta que o golpe não causou nenhum perigo à vida da vítima. O promotor depois entra com uma denúncia de tentativa de homicídio, porém o corpo de jurado não acata a tese do Ministério Público, reconhece e o acusado cometera crime de lesão corporal leve, previsto no artigo 129 do Código Penal. A pena pode ser de detenção de 3 meses 1 ano. Também pode acorrer o crime chamado de vias de fato, uma infração penal, prevista no artigo 21 do Decreto-Lei 3.688/41, que versa sobre a integridade física através da prática de atos de ataque ou violência contra pessoa, desde que não resulte em lesões corporais. São os atos agressivos de provocação praticados contra alguém, mas que não deixam marcas ou sequelas no corpo da vítima. Como a conduta é menos grave, a pena prevista é de prisão simples de 15 dias a 3 meses. Servem como exemplos quem pratica esse tipo de crime: empurrar, sacudir, rasgar ou arrancar roupas, puxar cabelo, dar socos ou pontapés, arremessar objetos e demais atos que não cheguem a causar lesão corporal.

Por derradeiro, quanto à pessoa da vítima que apanhou do magistrado, caso queira, pode entrar com uma ação de indenização por dano material e moral para compelir o juiz a indenizar a pessoa que sofrera de agressões desproporcionais e descomunais. Caso a ação seja julgada procedente, os valores representam os gastos que pessoa teve para se recuperar, como por exemplo, tratamento médico, com psicólogo, psiquiatra, entre outros profissionais que atuam em casos envolvendo briga e comentários no meio social, nas redes sociais e também na grande imprensa falada, escrita e televisada, o que de fato vem ocorrendo.

 

(Jornalista Ronan Almeida de Araújo – DRT-RO 431-98).


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