Na ação civil pública proposta pelo promotoria, Zenildo Pereira confessou que
fraudou processo de precatório quando era prefeito de São Miguel. O feito está
autuado sob o número 7003028-69.2018.8.22.0022 e foi distribuído pelo
parquet no dia 30/11/2018. Além dele, Cornélio Duarte, atual prefeito, figura
como parte passiva, que também mentiu várias vezes para o representante da
justiça que fraudo processo de precatório. Vamos os principais trechos apontados
na exordial da ação de improbidade em face dos agentes políticos. Diz o
representante da justiça pública: “Em 14 de junho de 2017, chegou a
conhecimento desta Promotoria de Justiça, através do Ofício n.º 737/2017 – Prec,
a ocorrência da quebra da ordem cronológica de pagamento do precatório n.º
0005668-07.2016.8.22.0000, efetuado pelo ex Prefeito de São Miguel do
Guaporé-RO ZENILDO PEREIRA DOS SANTOS. Visando melhor apurar tais
fatos, fora instaurado Inquérito Civil Público n. 007/2017/PJ-SMG (ParquetWeb
n. 2017001010019013), o qual serve de arrimo à presente Ação Civil Pública. No
curso do referido procedimento apuratório restou constatado que, no mês de
dezembro de 2016, o Demandado ZENILDO PEREIRA DOS SANTOS, Prefeito
de São Miguel do Guaporé-RO à época dos fatos, autorizou a quebra da ordem
cronológica de pagamento de precatórios, em benefício do credor que se
encontrava em último lugar da fila, a saber, o Auto Posto Zé Branco Ltda, sem a
observância do devido processo de emolumentos.
No mesmo trilhar investigatório, constatou-se que a empresa Auto Posto Teixeira
Ltda, em 28 de setembro de 2016, de igual modo recebeu o pagamento antecipado
aos demais precatórios, em seu processo n.º 0005216- 94.2016.8.22.0022, cujo
autorizador e pagador da despesa também foi o Demandado ZENILDO PEREIRA
DOS SANTOS. No mesmo diapasão, constatou-se que o Demandado CORNÉLIO
DUARTE DE CARVALHO prestou falsas declarações sobre o pagamento de
precatórios judiciais, quando emitiu a “Declaração de Regularidade Quanto ao
Pagamento de Precatórios Judiciais”, em 13 de abril de 2017 (fl. 36). Não obstante
a falsificação de informações retrodescrita, o gestor municipal permaneceu
emitindo falsas declarações sobre o objeto em apreço, por mais 06 (seis) vezes,
conforme documentos inclusos às fls. 24, 30, 33, 39, 44 e 46. Destarte, com fulcro
nas alegações retromencionadas, passo à análise e demonstração esmiuçada de
cada quebra cronológica da ordem de precatórios, bem como das inverídicas
declarações de regularidade municipal no pagamento de seus precatórios
judiciais, vejamos. Segundo a documentação encartada, a lista de pagamento em
testilha possuía o total 05 (cinco) precatórios (fl. 09), ao passo que o precatório
de n.º 0005668-07.2016.8.22.0000, relativo ao Auto Posto Zé Branco Ltda
ocupava o 5º e último lugar da fila.
Na contramão da ordem que deveria ser obedecida está a liquidação de empenho
em benefício do credor Auto Posto Zé Branco Ltda, no montante de R$ 48.353,08
(quarenta e oito mil e trezentos e cinquenta e três reais e quarenta e oito
centavos), ocorrida em 30 de dezembro de 2016. A nota de liquidação de
empenho acima colacionada foi emitida após a solicitação do pagamento da
despesa em questão, como se pode ver através das notas de solicitação,
autorização de despesa, e do empenho, datados em 29 de dezembro de 2016. No
curso da marcha procedimental supramencionada, a fim de melhor instruí-lo,
foram realizadas diversas oitivas, dentre elas, a do responsável pelo Auto Posto
Zé Branco Ltda, o qual esclarece e corrobora o expresso pagamento das verbas
pelo Demandado ZENILDO PEREIRA DOS SANTOS, Prefeito de São Miguel do
Guaporé-RO à época. É o que se extrai do termo de declarações prestadas por
Rubens Pereira Alves perante esta Promotoria de Justiça quando ouvido em 20
de setembro de 2018 (fl. 83/83-v).
Transcrevo: […] Que é sócio-proprietário, atuando na função de gerente, do Zé
Branco Auto Posto; Que é sócio-proprietário do Auto Posto desde a sua fundação,
em 2004 […] Que durante a gestão de Ângelo Pastório, a empresa do declarante
executou serviços, mas não recebeu por eles, tendo a dívida permanecido até a
gestão de Zenildo; Que no início de 2013, não se recordando exatamente a data,
Rubens procurou Zenildo, a fim de cobrar os valores correspondentes ao débito
que a Prefeitura tinha com o Auto Posto Zé Branco; Que Zenildo orientou o
declarante a requerer o pagamento judicialmente, alegando que desta forma seria
mais fácil o atendimento ao pleito do declarante; Que então o declarante
procurou o Dr. Ronaldo da Mota, em seu escritório, e contratou seus serviços;
Que no final de 2013, já próximo ao término do mandato de Zenildo, em uma
ocasião em que o declarante estava no corredor da Prefeitura, questionou Zenildo
sobre o pagamento; Que Zenildo pediu ao declarante para procurar o advogado
Ronaldo, a fim de verificar se não havia sido proferida alguma decisão judicial
sobre esse precatório; Que então o declarante procurou o escritório de Ronaldo,
sendo atendido na ocasião por Ranieli, que ainda não era advogada; Que Ranieli
fez contato com Dr. Ronaldo, que estava e, viagem, e pegou uma pasta um
documento que tinha o cabeçalho da Justiça, mas que o declarante não se recorda
o que estava escrito nele; Que de posse desse documento, o declarante procurou
novamente a Prefeitura e protocolou no Gabinete; Que no mês de janeiro de 2017
descobriu que tinha sido realizado o pagamento em favor da empresa; Que não
tinha informações sobre a existência de outros 4 precatórios anteriores ao seu, na
fila de pagamento […] (Termo de Declarações de Rubens Pereira Alves, quando
ouvido na sede da Promotoria de Justiça de São Miguel do Guaporé/RO em 20
de setembro de 2018, às 15h30min, referente aos autos do ICP n.º 007/2017).
Calha aclarar que fatos foram confirmados pelo próprio Demandando ZENILDO
PEREIRA DOS SANTOS, quando ouvido nesta Promotoria de Justiça em 19 de
setembro de 2018 (fl. 74/74-v), onde de forma uníssona corrobora as informações
prestadas pelo responsável pelo Auto Posto Zé Branco Ltda, pelo que passo a
transcrever parte de seu depoimento: […] Que Rubens, representante do Auto
Posto Zé Branco, procurou o declarante solicitando o pagamento do valor de R$
48.353,08;
Que Rubens procurou o declarante no final de sua gestão, alegando que, embora
tivesse conhecimento de pagamento de todas as sentenças de dívidas anteriores
de outras empresas, não havia sido paga a dívida para o Auto Posto Zé Branco;
Que Zenildo alegou que não possuía a sentença em mãos, para a realização de
pagamento; Que Rubens apresentou, com a Advogada Ranieli, uma sentença
judicial; Que foi apresentado um documento em que constava o nome “Sentença
judicial”; […] Que na ocasião em que o declarante pagou a empresa Zé Branco, o
declarante não tinha conhecimento de que existiam outros precatórios anteriores
ao da empresa Zé Branco; Que o declarante não procurou nenhum servidor da
Prefeitura para confirmar a legalidade de pagamento dessa dívida; Que tanto o
declarante quanto o setor jurídico da Prefeitura não haviam sido notificados
acerca da sentença judicial em relação à empresa Auto Posto Zé Branco; Que o
setor da Prefeitura responsável pelos precatórios era o setor jurídico; Que não foi
assessorado juridicamente por nenhum advogado com relação ao pagamento
dessa dívida do Auto Posto Zé Branco […] (Termo de Declarações de Zenildo
Pereira dos Santos, quando ouvido na sede da Promotoria de Justiça de São
Miguel do Guaporé/RO, em 19 de setembro de 2018, às 16h30min, referente aos
autos do ICP n.º 007/2017).
Vejamos que próprio Demandado ZENILDO PEREIRA DOS SANTOS reconhece
que autorizou o pagamento dos valores devidos ao Auto Posto Zé Branco Ltda,
após o contato realizado pelo responsável da empresa em referência, alegando
desconhecer que haviam outros precatórios na fila de pagamento. Somado ao
fato, tem-se o depoimento prestado por Rubens Pereira Alves, que foi categórico
em suas alegações, dizendo que, de fato procurou o Prefeito à época e requereu o
pagamento dos valores a título de precatório. Observadas as alegações do
Demandado, somado aos demais documentos probatórios, vê-se que é
incontroverso e embasado por provas que houve Auto Posto Zé Branco Ltda era
titular do precatório expedido contra o Município de São Miguel do Guaporé-RO,
o qual foi pago antecipadamente aos preteridos listados em documento
específico. Todavia, é igualmente certo que, à época do pagamento o referido
crédito figurava, em 5º lugar na lista de precatórios, organizada de acordo com a
ordem de expedição, como bem clareiam os documentos que seguem acostados.
Na esteira do alegado, as quebras da ordem de pagamento do precatório é fato
inequívoco. Em que pese a justificativa apresentada pelo Demandado ZENILDO
PEREIRA DOS SANTOS que desconhecia a existência de precatórios em aguardo
de pagamento, a quitação antecipada do precatório que se encontrava em última
posição da fila cronológica configura violação às normas do art. 100 da
Constituição Federal, bem como aos princípios da legalidade e impessoalidade. A
norma constitucional acima descrita visa assegurar a isonomia entre as pessoas
titulares de créditos decorrentes de sentenças judiciais contra a Fazenda Pública,
justamente para impedir que interesses meramente particulares sejam
sobrepostos sobre a legalidade dos atos a serem praticados.
Não obstante, tal preceito não foi respeitado pelo Demandado ZENILDO
PEREIRA DOS SANTOS. Em ocasiões posteriores, todos precatórios preteridos
foram quitados pela municipalidade, segundo o que se observa dos processos nºs
1593, 1039, 1040, 1041 e 1251, que seguem anexos a presente exordial. O
Demandado ZENILDO PEREIRA DOS SANTOS, quando prestou declarações
nesta Promotoria de Justiça, declinou que desconhecia a existência de uma lista
contendo outros precatórios judiciais a serem liquidados pela municipalidade,
respeitando-se a ordem em que foram sentenciados. 1Art. 100. Os pagamentos
devidos pelas Fazendas Públicas Federal, Estaduais, Distrital e Municipais, em
virtude de sentença judiciária, far-se-ão exclusivamente na ordem cronológica de
apresentação dos precatórios e à conta dos créditos respectivos, proibida a
designação de casos ou de pessoas nas dotações orçamentárias e nos créditos
adicionais abertos para este fim. Todavia, tais alegações não merecem qualquer
guarida, eis que totalmente descabidas e desconexas com o dever legal conferido
ao gestor municipal em suas atribuições. O desconhecimento da lei é, em
princípio, inescusável. Tal afirmação vem sendo aplicada ao Direito desde o
Império Romano, até os dias atuais, com vistas a afastar qualquer alegação de
desconhecimento do que se contém no ordenamento jurídico, principalmente
sobre aqueles que detém o dever do saber e, para também não se esquivarem de
responsabilização pelos atos praticados. No que respeita o alegado, o art. 3º da
Lei de Introdução ao Código Civil (Decreto-Lei n.º 4.657/1942), bem preceitua
que “Ninguém se escusa de cumprir a lei, alegando que não a conhece”. Assim,
em atenção ao princípio em comento, salvaguardando a legalidade que deve ser
protegida, não prospera o desconhecimento de como deveriam ocorrer os
precatórios pagos por ZENILDO PEREIRA DOS SANTOS”, conclui